Neste mês de maio tive uma das experiências mais duras dos últimos tempos, tanto a nível físico como psicológico e emocional.
Estive a trabalhar em regime de voluntariado, num restaurante em horário pós laboral na tenda da alimentação, na Feira de Maio (https://www.feiradeleiria.pt/feira.php). Diariamente tínhamos o espaço aberto para o jantar, de domingo a domingo, a partir da instituição da qual faço parte – a banda filarmónica da localidade onde vivo.
A instituição na qual os meus filhos são executantes e fervorosos adeptos. É a sua segunda casa e a segunda família. Em que a partilha de experiências e vivências é extraordinária e onde há pessoal dos 8 aos 80 anos.
Desde os mais caçulas aos mais crescidos, todos são integrados, como se fizessem parte da ‘mobília’, desde sempre. A relação entre eles é muito boa, dentro ou fora da instituição.
Na nossa família, a música sempre fez sentido, e para além de acalmar, estimula a memória e a atenção e os diferentes tipos de música permitem diferentes emoções e trazem lembranças, muitas lembranças! Sejam elas positivas ou negativas, tendo quase sempre um efeito terapêutico.
A aprendizagem da música permite:
- Capacidade de memorização;
- Melhora a capacidade de gestão do tempo e organização;
- Estimula o trabalho em equipa;
- Estimula a perseverança;
- Melhora a coordenação motora;
- Ajuda na aprendizagem da matemática, bem como a leitura e capacidade de compreensão;
- Aumenta o sentido de responsabilidade;
- Aumenta a capacidade de concentração;
- Alivia o stress;
- Promove as competências sociais;
- Promove a capacidade de escuta;
- Ajuda na disciplina;
- Melhora na respiração;
- Etc.
Podíamos estar aqui eternamente a enumerar os benefícios da música e da sua aprendizagem… Para bem dizer, a música é um elixir de bem-estar!
Claro está que a música não faz sentido a algumas famílias, cada um com as suas necessidades e gostos. E as atividades que os filhos têm, estão relacionadas com as experiências e vivências de cada uma.
Mas voltando à história do restaurante da feira, e o quanto mexeu comigo e com a minha família.
A gestão desse dito restaurante é tramada! É preciso sempre muita gente com vontade de trabalhar, quer seja na cozinha, quer seja para servir às mesas e o pessoal voluntário é imprescindível.
Por norma, quem lá esteve a trabalhar diariamente foi o pessoal da direção (no qual me incluo) e uma cozinheira permanente e, para ajudar voluntariamente tínhamos os pais e os nossos executantes, quase sempre os mais novos.
É uma experiência que querem sempre repetir, ano após ano, porque ali sentem-se úteis, gostam do ambiente e levam a sua tarefa de forma muito profissional.
Dos mais introvertidos aos mais extrovertidos, todos têm o seu papel e função… no final do mês nota-se uma evolução brutal a nível das relações humanas, a cumplicidade entre eles e connosco (pessoal da direção) é enorme e superam muitos dos seus medos e inseguranças.
No meu caso concreto, ter que cumprir um horário laboral e depois ter que ir para este voluntariado forçado, juntando a ComTudo e a gestão familiar, sinto que falhei em todo o lado!
Mas sou humana e está tudo bem com isso, foi uma situação temporária. Com planeamento e organização tudo se fez!
Apesar de ser muito duro, porque sempre quis fazer tudo perfeito, mas também me disseram que mais vale feito do que perfeito e as coisas vão melhorando com o tempo!
As emoções estavam sempre ao rubro, andava numa roda viva e nem tinha tempo para respirar, dormir? Talvez umas 4 horas por noite, andei de rastos e nem sabia a quantas andava!
Fisicamente, o cansaço foi extremo e está a ser difícil de recompor.
A nível psicológico também foi complexo, a pressão era tremenda e tiveram que haver muitas cedências a nível familiar, o que fez mossa, muita mossa…
Ainda por cima os meus filhos também queriam ir para lá trabalhar e esqueciam-se que a vida cá fora continuava. A parte escolar ressentiu-se um pouco, pelo menos para o caçula, que como confidenciei à um tempo atrás, o safado não gosta de estudar!
Claro que só iam à sexta e sábado, durante a semana não os deixava que precisavam de deitar cedo, porque as aulas começam às 8h30, mas apesar disso como não estava em casa para relembrar as prioridades, às vezes era o caos, estava eu a chegar a casa por volta da meia noite, uma ou duas da manhã e ainda estavam levantados! Apesar de já terem idade de terem responsabilidade na hora de dormir, o pai também o permitia …. (era de arrancar cabelos)
Esta foi a minha primeira vez nestas andanças, foram muitas novidades, muitas coisas diferentes, conheci muitas pessoas e foi um privilégio terem aparecido na minha vida.
Gosto muito de pessoas, de conversar, de ouvir e trocar experiências e neste mês ‘tirei a barriga de misérias’ 🙂 Aprendi muito e conheci muitas histórias de vida, umas mais felizes que outras, mas todas elas importantes e merecedoras de serem guardadas num cantinho especial da memória!
Estas vivências e experiências unem muito mais quem as vive e hoje parece que conheço essas pessoas desde sempre.
Quanto ao contacto com o público, lidar com a pressão inerente aos atrasos nos pedidos, a correria para atender os clientes e as ‘larachas’ que temos de dizer para os manter bem dispostos e calmos e ainda estar sempre de cara alegre, é uma tarefa árdua. Tiro o chapéu a quem o faz diariamente!
Mas o que mais me chocou nem foi a complexidade e o cansaço, foi mesmo o desperdício alimentar…
Desde sempre, que o desperdício alimentar me faz muitas cócegas. Não gosto de deitar, nem de ver ninguém deitar comida fora ou estragar, fico doente!
Sempre incuti aos meus filhos que o que vai para o prato tem que ser comido e que mais vale tirar pouco e repetir, se ainda houver vontade, do que encher o prato à bruta e depois deitar fora, quando poderia dar para outros.
E ali, ver que pediam vários pratos, petiscos e depois vinha metade para dentro e era não por não gostarem da comida, mas porque havia ‘mais olhos que barriga’ … fervia por dentro!
Esgotava-se a matéria prima e não vendíamos a outras pessoas porque já não havia. A nível de negócio era indiferente vender a b ou c. O dinheiro entrava, mas e as necessidades das pessoas eram realmente satisfeitas?
Fez-me pensar e refletir bastante sobre o assunto. Era assustadora a quantidade de comida que se estava a deitar fora…
E os números do desperdício alimentar são assustadores, estima-se que cerca de 360 mil pessoas passam fome em Portugal, mas por outro lado os portugueses deitam fora um milhão de toneladas de alimentos por ano e esse desperdício acontece em casa. Incoerências estranhas que me dão a volta à cabeça e não me fazem sentido…
O desperdício alimentar não só é um problema social, também gera impacto no meio ambiente, através das emissões de gases de estufa para a atmosfera e o desperdício alimentar é responsável por 8% destas emissões. Porque quando os alimentos vão parar a aterros, decompõem-se e geram gás metano, um dos equivalentes de CO2.
1 Kg de comida gera cerca de 2,5 Kg de equivalente de CO2. Estima-se que 25% do aquecimento global seja resultado de emissões de gás metano.
Já para não falar da produção e da confeção alimentar.
Por isso, é que a única parte negativa desta experiência da Feira de Leiria foi mesmo e só o desperdício alimentar, porque se cada um fizer a sua parte muita coisa pode melhorar para o nosso planeta e por conseguinte para o futuro das nossas crianças!
A sensibilização não pode vir apenas da escola, em casa é muito importante que os pais eduquem os filhos para o que realmente é essencial e primordial.
Quanto ao cansaço físico, às poucas horas dormidas, as falhas na família acabarão por ser compensadas futuramente!
Trabalhar para a instituição que os meus filhos tanto gostam, permite ajudar e beneficiar mais jovens na aprendizagem da música e na pertença a um grupo no qual são acolhidos como se de família se tratasse e que tanta falta faz nos tempos que correm!